Ela vai pra tal festa que a amiga apelidou de "queijos, vinhos e novos amigos". A ideia era que cada uma levasse um amigo solteiro que achasse bacana, pra apresentar pras amigas. "Taí! Pode ser um jeito legal de fazer amizades e, quem sabe, conhecer algum carinha interessante!", pensa. Se tem expectativas? Honestamente, por mais que tente bancar a mulher independente e tranquila, claro que tem! São quase dois anos sem namorar e, depois que resolveu ser mais seletiva e menos baladeira, nem se lembra de quem foi o último cara que acordou do seu lado e deu bom dia. "Triste isso!", conclui.
Munida de seu amigo solteiro no melhor estilo partidão e de um visual moderninho, lá vai ela. A mulherada parece não ter entendido direito a proposta da festa e metade aparece sem o tal novo amigo. "Pôxa! Que pena...", constata. Dentre os poucos presentes, o saldo era praticamente negativo: um instrutor de ioga inrustido, um comprometido, um coração recentemente partido... e um tipo meio moderno, barbinha rala, que vem puxar papo e não vai nunca mais.
_ "O que você faz?"
_ "Sou cineasta."
"Huuum... vamos ver qual é a sua.", diz pra si mesma.
Dia seguinte começa com cara de preguiça, almoço de domingo atualização de fofoca com a amiga. Mas antes uma passadinha pelo Facebook pra saber o que tá rolando na vida dos outros. Paralisada, ela lê e relê:
"XXX is in a relationship"
"Oh!" "Ouch!"
E o telefone toca e a amiga a resgata para o almoço. Papo vai, vem... e o tal carinha liga e combinam um jantar. Ela tem a leve impressão de possivelmente estar cometendo um erro e de o moço às vezes parecer muito self-absorbed e full of himself. "Ah, deve ser empolgação passageira de quem tá querendo impressionar. Isso passa!" E repete pra si mesma: "Não custa (me) dar uma chance".
Sendo cineasta, motivo a mais pra vir com aquele papinho de "vamos ver um filme lá em casa?". "Já vi esse filme antes! Daí vai querer me mostrar seu longa... ou curta. E vai que eu não curta?!" "Ok, talvez um pouco de privacidade não nos faça mal... e ele não me parece o tipo que não saberia diferenciar entre sinal verde ou vermelho."
Depois de andar pelas ruas nada hospitaleiras de um bairro nada convidativo no centro da cidade, enquanto se perguntava porque não estavam num táxi, chegam ao apartamento do moço. Prédio antigo. Já o apartamento... Ela olha ao redor: paredes cinza quase escuro, meio descascando. Batentes brancos encardidos, sofás, mouse pad e tudo mais: idem. Piso de madeira antigo, que tinha sido bonito um dia. No momento, tinha aquela coloração escura nas bordas, como numa mistura de poeira com gordura, típico de quem não via uma boa vassoura e pano de chão há quase tantas décadas quanto o apartamento em si deveria ter.
Senta-se pra recuperar-se do choque. Respira fundo, imaginando o quarto, a cama. Lembra-se que está com vontade de ir ao banheiro. E arrepende-se de ter pedido. Olha para o vaso que um dia foi branco. Pergunta-se se o marrom que hoje apresenta seria a ferrugem do encanamento ou falta de ser esfregado devida e periodicamente. Dá descarga e a válvula lhe dá um banho. Ao tentar lavar as mãos, constata que falta água e sobram pelos, talvez da barba aparada, sabe-se lá quando, na tal da pia. E então transborda, finalmente. O choro vem em bicas, inunda. "Loser!!!" "Where am I?!" What am I doing here?!" "What have I put myself into?!", celular em punho, chamando o rádio-táxi.
Enquanto pensava no filme que nunca veria e no cineasta que nunca teria uma carreira promissora em sua vida, em sua cabeça passava as melhores cenas do começo de um filme bastante conhecido, frequentemente reprisado. Seu filme um dia favorito, que agora deveria sair de vez de cartaz.
sábado, 1 de maio de 2010
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